No nosso país, a pobreza energética é uma questão preocupante, já que "18,9% da população em 2019" não tem capacidade financeira para manter as habitações aquecidas de modo adequado, um valor bastante acima da média europeia - 7% (Público, 2020). O estado atual é fruto de um conjunto de variáveis, como a cultura de não privilegiarmos a escolha pelo aquecimento centralizado - prática comum noutros países -, mas também por grande parte do nosso parque habitacional não ter isolamento térmico.
Nesta publicação, exploramos o papel que a arquitetura e a construção podem ter na resolução deste problema, a importância que o bom isolamento térmico tem na nossa saúde pública e o futuro dos sistemas de controlo da temperatura, motivado pelo desenvolvimento tecnológico em curso.
Não é preciso recuarmos muito na história para nos confrontarmos com um tempo em que o ser humano não gozava das regalias atuais: aquecimento central, ar condicionado ou um singelo aquecedor. Nesse tempo, a forma de nos defendermos do clima mais frio moldava a própria arquitetura das casas. Recorriam-se assim a técnicas que, parecendo-nos hoje de uma lógica inesperada, à época não eram mais do que o saber do povo, mostrando-os assim que, muitas vezes, uma boa solução de arquitetura pode estar ao nível dos maiores adventos da tecnologia.
No Minho, por exemplo, era comum as casas comporem-se por dois pisos, um térreo, construído em pedra e destinado ao gado - a chamada loja dos animais -, e um piso superior que compreendia as divisões de viver. Este piso, senão integralmente em madeira (já que o piso inferior a protegia da humidade do solo), tinha pelo menos um sobrado, de forma a que o calor dos jumentos subisse facilmente e aquecesse a casa.
Olhando para os dias de hoje, e segundo um recente artigo do Público, "na segunda metade de 2018, cálculos do Eurostat que tomaram em consideração as diferenças de poder de compra entre os países mostraram que Portugal foi o país da UE com a eletricidade mais cara para as famílias." Grande parte do problema reside nos impostos e taxas nos preços da eletricidade cobrados aos consumidores. A falta ou insuficiente ação política nesta matéria denota o hábito já enraizado de passarmos frio dentro de casa durante o Inverno.
Em 2021, estão previstas novas reduções nos preços para quem usufrui de tarifas sociais, mas a resolução deste problema tem de ser acompanhada por soluções que garantam a eficiência da energia gasta no aquecimento. Uma casa não ou mal isolada termicamente terá maiores e mais rápidas perdas de calor, fazendo com que o valor despendido no aquecimento não reverta verdadeiramente em conforto durante o Inverno.
A imagem abaixo ilustra o panorama em torno das grandes cidades: subúrbios construídos muito rapidamente, nas décadas de 70 e 80, fruto da pressão demográfica causada pelo êxodo rural. Grande parte destes prédios não foi desenhado com o apoio de profissionais especializados, na tentativa de poupar e reduzir custos. Contudo, os baixos salários e períodos de crise económica recentes, têm colocado a manutenção e melhoria das habitações em segundo plano nos orçamentos familiares.
Num período em que impera acautelar o impacto que as nossas escolhas energéticas têm, a opção mais sustentável para aquecermos a nossa habitação tem de ter em conta vários fatores. Por vezes a escolha mais económica para um apartamento T1 com 80m2 não é a mesma para uma moradia T4 com mais de 200. Por vezes a opção mais amiga do ambiente não se encontra disponível ou não cabe no nosso orçamento mensal.
Alguns tópicos a ter em consideração na escolha são, por exemplo, o custo mensal, o gasto energético para a eficiência obtida, a(s) fonte(s) da energia utilizada(s) para alimentar o equipamento escolhido, o tempo de aquecimento, o custo de manutenção, eventual compatibilidade com tarifas energéticas mais baratas, entre outros. Para ajudar a compreender melhor as opções disponíveis no mercado, as vantagens e desvantagens das mesmas aplicadas a casos-tipo concretos, partilhamos um artigo do Jornal de Negócios.
A eficiência energética não tem em conta apenas a existência e o desempenho de um sistema de aquecimento, mas considera também a insonorização, o isolamento, a inércia térmica e a qualidade do ar, tornando a sua avaliação algo complexa e envolvendo fatores desde a localização e exposição do imóvel, aos materiais que o constituem. Apenas em 1990 foi criada a primeira regulamentação sobre a eficiência energética das casas portuguesas (CEE), ao passo que na maioria dos países europeus esse cuidado já existia desde os anos 50 (altura da formação do nosso RGEU, que neste âmbito, contudo, desempenhava um tímido papel), traduzindo-se isso também nas diferentes preocupações da arquitectura local.
O atelier Renzo Piano Building Workshop é uma referência mundial pela integração de soluções de eficiência energética em todos os seus programas. Os desenhos aqui apresentados são disso um exemplo, onde, para além dos elementos construídos, também elementos naturais como o sol e a vegetação definem o conforto dos espaços.
Em 2016, a Comissão Europeia lançou linhas-guia com o objetivo de quatro anos depois garantir que quase todos os novos edifícios construídos nos vários estados membros se aproximariam do conceito "Nearly Zero Energy Buildings" (NZEB), isto é, que apresentem consumos de energia mínimos, garantindo todas as suas comodidades modernas, através de estratégias construtivas e mecanismos que garantam a maior eficiência possível. Os consumos feitos devem ainda ser cobertos na medida do possível por energia dita "limpa", proveniente de fontes renováveis, como a solar, a eólica ou a geotérmica.
Este é um tema central, visto que se estima que atualmente 40% do consumo energético europeu esteja associado à utilização de edifícios. Sabe-se que quanto maior a nossa dependência de grandes quantidades de energia, maior é o risco de pobreza energética e maiores são também os impactos na nossa saúde pública. Portugal já apresentou o seu plano nacional para caminhar neste sentido.